Janeiro, com seus dias longos e abafados, parece um convite ao ócio, mas nem tudo é descanso sob o sol. Nas casas de praia ao longo dos 410km de litoral potiguar, um outro tipo de movimento acontece. Longe dos holofotes, sob a brisa leve do entardecer e entre goles de caipirinha ou água de coco, as verdadeiras decisões se formam. É ali, entre um espreguiçador, uma rede ou mesmo uma cadeira, que o futuro se escreve – ou, ao menos, se desenha.
As conversas começam despretensiosas, como se falassem do calor do dia ou da temperatura da água. Mas bastam alguns minutos, e o tom muda. De repente, surge um nome importante, um projeto ambicioso, um cargo ainda vago. Um cochicho aqui, uma risada contida ali. O jogo começa.
Nas varandas, ninguém é exatamente o que parece. Tem o vizinho que só observa, fingindo ler um livro, mas que escuta cada palavra sussurrada. Tem o que fala alto demais, gesticula com força, querendo mostrar poder – ou escondendo sua insegurança. Tem o que parece relaxado, mas está no celular, disparando mensagens que podem virar manchetes. E tem, claro, o espectador desavisado, que não faz ideia de que está diante de uma peça fundamental do quebra-cabeça político do próximo ano.
Os conchavos têm cheiro de maresia e som de ondas quebrando. É um cenário perfeito para acordos informais. “Depois a gente formaliza”, dizem, enquanto brindam. Uns estão por dentro, sabem os detalhes e os caminhos, enquanto outros ficam de fora, só deduzindo. A cada reunião improvisada, o verão ganha ares de convenção política: alianças são costuradas, adversários viram aliados, e as decisões mais impactantes nascem ali, ao lado da churrasqueira.
Quem vê de longe acha que é só uma conversa qualquer. Afinal, o verão tem dessas: tudo parece leve, descompromissado. Mas a verdade é que, enquanto muitos mergulham no mar ou cochilam na rede, o futuro anda sendo decidido, informalmente, sob os alpendres das casas de praia.
E quando o verão acabar e os dias voltarem ao ritmo normal, o que foi acordado na brisa das varandas se tornará lei. Uns dirão que é sorte, outros, articulação. Mas, no fim, pouca gente lembrará , que o destino foi traçado sob o sol de janeiro, entre um riso abafado e uma sombra de coqueiro.
O verão, como sempre, é mais do que parece.
E as varandas das casas de praia, bem mais do que um lugar para fugir do calor.
Noca Gomes.